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O GRITO DO BRIC.

Publicada em 15/06/2009 às 14:15:35

O GRITO DO BRIC.O grito do BRIC.


Reunidos na Rússia, os líderes dos quatro grandes emergentes formalizam uma união que pode lhes dar ainda mais peso no cenário global


LULA encontrará na Rússia o presidente local, DMITRI MEDVEDEV, o líder indiano MANMOHAN SINGH e seu colega chinês HU JINTAO: a primeira reunião formal do grupo preocupa o governo dos Estados Unidos


Quando se reunirem nesta terça-feira em Ekaterimburgo, pequena cidade dos Montes Urais onde foi executado o último czar russo, os líderes do Brasil, da Rússia, Índia e China devem finalmente dar corpo ao acrônimo criado em 2001 pelo economista Jim ONeill. Num relatório da Goldman Sachs, ele afirmou que este grupo, batizado de BRIC, lideraria a economia mundial em 2020. Nestes oito anos, ONeill atualizou a previsão várias vezes, mas manteve o tom otimista. A crise internacional, que atingiu com mais força os países desenvolvidos, ajudou os emergentes ao lhes dar não apenas uma nova voz, mas ao torná-los fundamentais para manter a economia rodando num momento em que o PIB mundial deve encolher 1,3%, de acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI). É com este espírito que Luiz Inácio Lula da Silva, Dmitri Medvedev, Manmohan Singh e Hu Jintao se encontram para tentar aproximar posições a partir dos temas definidos na primeira reunião de cúpula do G-20 em novembro do ano passado, no auge da crise. Eles querem a reforma do sistema financeiro e um reposicionamento do papel dos países emergentes na ordem econômica mundial. Querem maior participação em organismos como o próprio FMI e regras mais rígidas para as finanças mundiais. Têm, como argumento, um peso político e econômico nada desprezível: o BRIC representa 41% da população do planeta, 28% da superfície da Terra e 16% do PIB mundial. De acordo com a projeção do Fundo, os países desenvolvidos terão uma retração de 3,8% este ano, enquanto os emergentes devem crescer em média 1,6%, puxados pela alta ainda acelerada da China, de 6,5%, e da Índia, de 4,5%. O Brasil, com crescimento menor, e a Rússia, com queda de 6%, são donos de recursos naturais - combustíveis fósseis no caso russo e petróleo, minérios, biocombustíveis e alimentos no caso brasileiro - que os tornam parceiros estratégicos justamente para os países com crescimento acelerado.


O desafio da reunião de Ekaterimburgo é dar unidade a um grupo com grande diversidade e pouco em comum, além do tamanho. "O Bric vem ganhando surpreendente densidade e na minha opinião ele se revelará mais importante do que G-20 e o G-8, que misturam países de dimensões e interesses diferentes", disse à DINHEIRO o ministro Roberto Mangabeira Unger, da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência. "O Bric passará a ter densidade à medida que tiverem um projeto comum. No momento eles estão num nível intermediário entre ter apenas preocupações comuns e ter um projeto comum", afirmou Mangabeira, que há duas semanas participou em Moscou de uma reunião preparatória da cúpula presidencial. Esta é a primeira reunião agendada especificamente para discutir os temas da agenda comum, mas os quatro líderes já se encontraram no ano passado, quando participavam da reunião do G-8, no Japão. Para o presidente Lula, a crise é uma oportunidade de mostrar que os países em desenvolvimento merecem um papel mais destacado na definição das regras do sistema financeiro, do comércio e da segurança mundial, já que serão importantes para a retomada do crescimento. "O que a crise fez foi tornar esses países mais evidentes, porque alguns deles estão enfrentando a crise melhor do que as velhas economias mundiais", afirma Francisco Carlos Teixeira da Silva, professor de relações internacionais da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Para ele, embora o grupo não tenha uma institucionalidade, sua existência já indica uma desconcentração do poder dos Estados Unidos.

O questionamento do dólar como moeda de reserva internacional é um dos assuntos da reunião. O presidente russo deve propor a criação de uma nova moeda escritural. Em março, o presidente do Banco central chinês, Zhou Xiaochuan, sugeriu a utilização de um mecanismo semelhante ao direito especial de saque do FMI como uma alternativa ao dólar, mas a discussão não avançou. Com mais de US$ 760 bilhões em papéis do Tesouro americano, a China vive o dilema de preservar o valor do dólar ao mesmo tempo que tenta mostrar força. Enquanto a ideia não chega ao papel, os quatro países reforçaram suas reservas em dólar no mês passado, aproveitando a desvalorização da moeda americana. Juntos, compraram US$ 60 bilhões justamente para evitar uma queda mais acentuada de suas moedas nacionais e a perda da competitividade internacional. Ainda assim, em maio o real se valorizou 11,2%, o rublo ganhou 6,9% e a rúpia subiu 6,4% em relação ao dólar. O yuan chinês só não seguiu o mesmo caminho porque o governo segurou a cotação para evitar uma queda ainda maior das exportações com a crise internacional.


Uma das preocupações do Brasil, porém, é deixar claro que a união dos quatro não é um contraponto aos americanos. Mangabeira diz que sentiu, em sua última viagem a Washington, a cautela dos americanos com a associação. "Há uma clara preocupação. E é natural, porque são os quatro maiores países emergentes do mundo", diz ele. Na agenda dos chefes de Estado ainda estão outros temas de interesse do Brasil, como as mudanças climáticas e os biocombustíveis. Os três países têm interesse na tecnologia brasileira de produção de etanol e biodiesel, embora a Rússia ainda se alinhe, como grande exportador, na defesa dos interesses da indústria de petróleo. A China, que já fez um acordo de fornecimento de longo prazo com a Petrobras, manifestou interesse em investir na produção de biocombustíveis na África. Não são as discordâncias pontuais nem os vários pontos em comum que marcarão, no entanto, a inédita reunião na Rússia. O que deve sair de lá é a certeza de que, quando falam juntos, o Bric não pode ser ignorado por ninguém.


Fonte: ISTO É.